ELABORADO PELA PROFA. CLAUDIA LOUREIRO
INTRODUÇÃO
Neste documento o leitor encontrará algumas notícias sobre a União Europeia, bem como algumas decisões de tribunais internacionais.
Para esta edição da tradicional Newsletter do Projeto Global Crossings, elaborada exclusivamente pela Profa. Claudia Loureiro, o objetivo principal foi apresentar as informações mais relevantes relacionadas às mudanças climáticas, à litigância climática e à postura da União Europeia no contexto da COP 30.
Apesar de ser um documento que tem finalidade informativa, de apenas apresentar decisões e notícias, destaca-se como seu fundamento o greening, o esverdeamento dos direitos humanos, postura presente no âmbito da conduta da União Europeia frente à COP 30, bem como diante da obrigatoriedade de formulação das Condutas Nacionalmente Determinadas – NDC’s. Ademais, a tônica do greening também se manifesta nas decisões da CEDH, da CIJ e da CTIDH, conforme será visto oportunamente.
O esverdeamento dos direitos humanos deixou de ser apenas um movimento, doutrina ou tese e passou a comportar a natureza jurídica de obrigação imposta aos Estados com a consideração do direito ao meio ambiente como direito humano pela Assembleia Geral das Nações Unidas, pela Resolução n. 76/300, de 2022.
A consideração do direito ao meio ambiente sadio como direito humano não se apresenta como mera retórica, mas reverbera seu conteúdo no contexto das instituições, organizações, mecanismos e institutos jurídicos que perfazem os regimes internacionais de proteção aos direitos humanos, consolidando-se como comportamento que deve ser adotado no contexto do ordenamento e do sistema jurídico de direito internacional e dos direitos humanos.
O greening ganhou maior relevância com a publicação da Opinião Consultiva da Corte Internacional de Justiça sobre as obrigações dos Estados em relação ao meio ambiente, considerando o sistema climático como bem comum global, além de ressaltar o direito humano ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Assim, considerando-se que o acesso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é pressuposto para que as pessoas exerçam direitos humanos e fundamentais, é natural concluir que os Estados, as Organizações Internacionais, a sociedade civil e os indivíduos devem agir com a devida diligência no sentido de adotar todas as medidas necessárias para o enfrentamento das externalidades oriundas das mudança climáticas, inclusive com a observância do princípio da cooperação nacional, internacional e global.
Com o sentimento de que todos devem se comprometer a preservar a Nossa Casa Comum, apresentamos a Newsletter – Edição outubro/2025, do Projeto Global Crossings, da Cátedra Jean Monnet, da Universidade Federal de Uberlândia.
1 NOTÍCIAS DA UNIÃO EUROPEIA
No período em que a comunidade internacional se prepara para a Conferência das Partes de n. 30, a ser realizada em Belém do Pará, no Brasil, emergem discussões a respeito da entrega da NDC’s – Contribuições Nacionalmente Determinadas, exigência imposta a todos os Estados-parte do Acordo de Paris, o que, de acordo com a periodicidade quinquenal estabelecida pelo Acordo, deveria ocorrer em 2025.
Até o momento, ainda restam NDC’s a serem entregues, apesar de o prazo ter se cumprido em setembro/2025. No encontro realizado em Nova York, por convocação do Secretário-geral das Nações Unidas, poucas Contribuições haviam sido entregues, inclusive as da União Europeia, que decidiu comparecer com o que denominou de carta de intenções.
A postura dos países em relação à apresentação de suas NDC’s preocupa e gera uma expectativa muito grande em relação à eficácia das discussões e das ações a serem adotadas no âmbito da COP 30, uma vez que esta terá como temas centrais as atenuações das alterações climáticas, bem como os compromissos registrados nas NDC’s.
De acordo com informações divulgadas pela União Europeia, estão entre as prioridades da organização para a COP 30:
- Resposta coletiva para manter a meta de aumento da temperatura global a 1,5º C;
- Reforçar a importância da precificação do carbono;
- Avançar nas metas de adaptação;
- Ampliar a mobilização do financiamento climático;
- Impulsionar a transição energética;
- Alinhar as NDC’s ao limite de 1,5º C.
Na proximidade da realização da COP 30, espera-se, com entusiasmo, que a União Europeia divulgue suas NDC’s, a fim de que possamos conhecer de que forma esses objetivos se adequam ao Acordo de Paris e, em especial, ao Pacto Ecológico Europeu.
Referências
– https://www.consilium.europa.eu/pt/meetings/env/2025/06/17/
2 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA
No momento disruptivo vivenciado pela comunidade internacional de avanço da utilização da Inteligência Artificial, destaca-se a decisão do Caso C-203/22 sobre inteligência artificial e o direito à explicação em decisões automatizadas.
O caso envolve uma empresa de concessão de crédito e uma cidadã europeia que teve a concessão de crédito negada com base em decisão automatizada.
O TJUE entendeu que, de acordo com o artigo 15 (1) (h) do Regulamento Geral de Proteção de Dados – GPDR, a decisão de negar o crédito precisa ser explicada, a fim de que o cidadão possa contestá-la ou solicitar intervenção humana.
Não se trata de explicar os algoritmos ou as fórmulas que foram utilizadas, mas sim, de embasar a negativa em fundamentos que possam ser alvo de contestação ou de intervenção humana posterior.
A importância do caso reside, portanto, no reconhecimento do direito à explicação.
Referências
3 CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS
O Caso Cannavacciuolo and others v. Italy merece destaque no contexto da litigância climática.
Na sequência do caso das Senhoras Idosas contra a Suíça, recentemente julgado pela CEDH, o tribunal europeu, mais uma vez se manifesta no contexto de uma ação envolvendo mudanças climáticas, o que demonstra a intensificação dos litígios climáticos no contexto supranacional.
O caso diz respeito aos danos causados aos indivíduos pela eliminação ilegal de resíduos por atores privados na região de Campânia.
De forma contraditória ao caso das Senhoras Idosas, a Corte entendeu que não haveria legitimidade de ação das associações, mas somente dos indivíduos, uma vez que estes não estariam impedidos de acionar por conta própria.
Em síntese, a Corte entendeu que houve violação ao direito à vida, de acordo com o artigo 2º da Convenção Europeia de Direitos Humanos, bem como do artigo 8º do mesmo documento.
A Corte seguiu o critério da devida diligência, entendendo que não foram adotadas as medidas adequadas pelas autoridades públicas para evitar os danos ao meio ambiente e aos indivíduos. Ademais, a Corte inclinou-se para a aplicação da causalidade geral, não se exigindo, a prova do nexo de causalidade entre os fatos e danos específicos à saúde das vítimas.
O caso reflete a intensificação do greening, esverdeamento dos direitos humanos, nos tribunais internacionais, bem como a intrínseca relação entre meio ambiente e direitos humanos.
Referência
https://hudoc.echr.coe.int/eng#{%22itemid%22:[%22001-241395%22]}
LOUREIRO, Claudia. Greening: o esverdeamento dos direitos humanos e o protagonismo da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Relações Internacionais no Mundo Atual, v. 5, p. 216-236, 2022.
4 CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA
No âmbito da Corte Internacional de Justiça, merece destaque a publicação da Opinião Consultiva sobre mudanças climáticas, a partir da solicitação da Assembleia Geral das Nações Unidas, Resolução n. 77/276 de 2023, em decorrência do ativismo da COSIS, Comissão de Pequenos Estados Insulares.
A inédita Opinião Consultiva pontuou as obrigações dos Estados em relação ao enfrentamento das mudanças climáticas, classificando-as como vinculativas, com o objetivo de proteger as atuais e as futuras gerações das externalidades das mudanças climáticas.
O Parecer Consultivo é benéfico à comunidade internacional, pois pode influenciar a tomada de decisão, orientar os tribunais internacionais e nacionais e contribuir para a construção de comportamentos estatais no sentido de observar a devida diligência no que diz respeito ao enfrentamento das consequências das mudanças climáticas.
Referências
https://www.icj-cij.org/sites/default/files/case-related/187/187-20250723-pre-01-00-en.pdf
https://docs.un.org/en/A/RES/77/276
5 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS
A Corte Interamericana de Direitos Humanos publicou a Opinião Consultiva n. 32/2025 sobre mudanças climáticas.
Em síntese, a Corte pontuou as obrigações dos Estados em relação ao enfretamento das mudanças climáticas, classificando-as em obrigações derivadas dos direitos substantivos, obrigações derivadas do direito ao meio ambiente sadio e obrigações derivadas dos direitos de procedimento, além de delimitar os direitos afetados pelos impactos climáticos.
De maneira breve, a Corte delineou os aspectos que fundamentam o direito humano ao meio ambiente sadio, bem como a consideração da natureza como sujeito de direito, além de mencionar o princípio da equidade intergeracional.
A Opinião Consultiva do tribunal interamericano também se encaixa no contexto da intensificação do movimento denominado de Greening.
Referência
https://corteidh.or.cr/tablas/OC-32-2025/index-por.html
6 TRIBUNAL INTERNACIONAL PARA O DIREITO DO MAR
O Tribunal Internacional para o Direito do Mar não ficou alheio à discussão relativa ao esverdeamento dos direitos humanos, greening, e publicou a Opinião Consultiva n. 31/2025 sobre as obrigações dos Estados em relação às mudanças climáticas e à proteção do ambiente marinho, a pedido da COSIS – Comissão de Pequenos Estados Insulares.
Em apertada síntese, apenas para efeito de noticiar a publicação do documento, o tribunal entendeu que os Estados devem adotar a devida diligência no sentido de prevenir, reduzir e de controlar a poluição do meio marinho, uma vez que os oceanos desempenham papel fundamental na regulação da temperatura da Terra.
Ainda ficou consignado no documento o dever de se aplicar o princípio da precaução, o que não exonera os Estados de adotarem todas as medidas necessárias para proteger os oceanos, de acordo com a devida diligência.
Referência
CONCLUSÃO
As notícias ora apresentadas nos conduzem à conclusão de que os sistemas internacionais de proteção aos direitos humanos e os Estados estão sendo cada vez mais pressionados a agirem de acordo com o ideal do greening, ou seja, de adotarem posturas condizentes com a perspectiva do esverdeamento dos direitos humanos.
Referida perspectiva, como mencionado anteriormente, não é apenas retórica, mas se coaduna com o princípio do desenvolvimento sustentável, considerando os direitos das atuais e das futuras gerações de terem o acesso aos recursos naturais para a consolidação de seus direitos humanos e fundamentais, bem como para o desenvolvimento de sua personalidade e capacidade jurídicas.
Nesse contexto, é oportuno destacar que a proteção do meio ambiente é interesse da humanidade, assumindo relevância intergeracional.
Ainda é relevante ressaltar que o esverdeamento dos direitos humanos, greening, concentra-se no contexto da metamorfose do mundo, anunciada por Ulrich Beck, contexto diante do qual os Estados deixam de ser o centro do mundo para ceder espaço aos interesses da humanidade como um todo.
Toda essa mudança de paradigma é confirmada pela própria evolução da comunidade internacional que demonstra mais do que transformação de princípios, valores e normas, mas que manifesta a própria metamorfose, encontrando na realidade disruptiva novos caminhos para o enfrentamento e o desenvolvimento de novos direitos, valores, princípios, normas e sistemas destinados à proteção dos interesses da humanidade.
Com entusiasmo,
Profa. Claudia Loureiro
Coordenadora da Cátedra Jean Monnet
Universidade Federal de Uberlândia
